Hildo Caitano – Don Gildo (in memoriam)

Mestra de Caxambu

“É um tempo muito diferente. A gente tem de resistir”

À primeira vista, o octogenário Hyldo Caitano, Don Gildo como é chamado pela família, parece desconfiado e avesso a conversa. Mas basta insistir na prosa para que ele comece a contar histórias e desfiar ensinamentos. Ao lado da irmã Canuta, é um dos guardiães do Caxambu Alegria de Viver, da comunidade de São Sebastião de Vargem Alegre, distrito de São Vicente.

Don Gildo é um dos mestres de Caxambu com mais tempo de atividade no Espírito Santo. Já são quase 70 anos no comando dos tambores. Em 2011 ganhou o Prêmio Mestre Armojo do Folclore Capixaba e recebeu também a certificação de Patrimônio Vivo de Cachoeiro, pela Lei Mestre João Inácio.

Nascido em 3 de dezembro de 1930, conta que aprendeu o Caxambu com a avó Estelina Maria da Conceição, a quem acompanhava nas brincadeiras desde pequeno. Ele se recorda de que bem menino, à noite, pegava um caixote e simulava que estava na roda.Uma ousadia porque criança não podia participar.

Bem humorado, diz que o segredo da vida longa é o equilíbrio em relação a tudo. Faz relato de um cotidiano árduo na juventude, mas feliz. “Socar o café no pilão, limpar o lampião, puxar a cana. Dava mais trabalho, mas era mais bonito”, avalia.

Havia muito trabalho, mas havia também muita festa. Em maio era um mês inteiro de rezas e rodas de Caxambu. “Juntava muita gente nas rodas. Era um povo unido”, diz. Lavrador aposentado, Don Gildo exibe braços fortes e rígidos para um ancião. Resultado da lida na lavoura e das décadas de tocador do Caxambu, o tambor maior que dá nome ao folguedo, função que assumiu aos 14 anos.

Don Gildo lembra também de ter recebido ensinamento sobre o folguedo de um velho jongueiro chamado Carolino, vizinho na juventude. Hoje, com a saúde fragilizada, já não acompanha o grupo na agenda de apresentações fora de Vargem Alegre. Mas nas rodas em frente à casa da família, faz questão de marcar presença. Busca energia para tocar o tambor centenário no compromisso assumido com os seus “troncos”, os ancestrais.

Don Gildo é uma referência de conhecimento sobre o folguedo. E busca difundir o que aprendeu com os antepassados, ensinando os próprios netos. Mas reconhece que não há muito interesse. “É uma tradição que veio do cativeiro. É nossa raiz mais profunda. Não pode se perder”.

Ele diz que bastam cinco ou dez pessoas para fazer uma roda de Caxambu. E que um bom jongueiro tem de ter a mente boa. “Tudo o que se aprende é de valor. O ensinamento a gente guarda. Mais prazer eu teria se os novos viessem seguindo. Seria mais animado. É um tempo diferente, mas a gente tem de resistir”.


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