Boi Pintadinho

A origem do boi

Grupos que patrimônio imaterial que tem a figura do boi como elemento central são comuns em todo o país, do Amazonas à Santa Catarina, recebendo várias denominações como Boi Mamão, Boi Bumbá, Bumba Meu Boi, Boi Pirilampo, Reis de Bois e Boi Pontadinho, cada um com algumas características distintas.

Não se sabe ao certo quanto a brincadeira do boi chegou à Cachoeiro de Itapemirim, entretanto, a brincadeira era muito comum no período de carnaval, sendo o Mestre Salatiel, um dos mais conhecidos donos de boi da cidade. Eram grupos que se organizavam nas periferias, mas que no carnaval, se dirigiam ao centro da cidade, em especial na região da Estação Leopoldina, para fazer a brincadeira. Era somente neste período, enquanto as elites da cidade se reuniam nos bailes carnavalescos fechados, é que negros e pobres realmente ocupavam a região central da cidade.

Com o passar dos anos e com a morte dos velhos donos de boi, como Mestre Salatiel, e também com a perseguição policial, os grupos foram aos poucos acabando.

Ao que parece, os grupos da cidade, ao contrário dos de outras regiões brasileiras, nunca tiveram o aspecto devocional ligado aos santos juninos. Eles se configuravam como grupos de trabalhadores negros e pobres que se reuniam apenas para brincar no período carnavalesco, mas esta “brincadeira” era de certa maneira um momento de resistência ao ocuparem, pelo menos uma vez ao ano a região central da cidade.

No ano de 2016, integrantes do grupo de quadrilha Tsunami do Boa Vista, buscando um divertimento para sua comunidade, após o cancelamento da festa de carnaval na cidade pelo prefeito da época, resolveu ir à Muqui para aprender a brincadeira do boi e reintroduzir novamente na cidade. Desta maneira ainda naquele ano o grupo se apresentou no bairro Boa Vista durante os dias de carnaval, e a partir daí passou a se apresentar todos os anos no mesmo período. O Boi Tsunami diverte as pessoas da comunidade que não tem recursos para sair da cidade em direção às praias da região no período carnavalesco.

A brincadeira consiste em um auto que representa a morte e a ressureição do boi, que foi morto para satisfazer os desejos de Mãe Maria que estava grávida e queria comer sua língua. A retirada da língua do boi por Pai Antônio fez com que ele morresse, mas logo depois o boi ressuscita, e é exatamente o momento da ressureição do boi que consiste toda a brincadeira.

Do Boi Tsunami, no ano de 2019, surgiu o Bezerro Tsunami que teve como objetivo atender às crianças da comunidade que não conseguiam brincar com o boi em função de seu tamanho e peso.

O grupo é composto por alguns personagens:

  • Dono do Boi: é quem comanda o grupo durante o cortejo e que também cuida do toque da bateria;
  • Espadeiro: é quem controla toda a evolução do boi, impedindo que ele cause acidentes durante sua evolução com os brincantes;
  • Fogueteiro: controla os fogos durante a evolução do boi, em especial quando ele chega na rua;
  • Bateria: composta por um número variável de integrantes, que são os responsáveis pelo ritmo da brincadeira;
  • Mulinha: é quem abre o caminho na multidão para o cortejo do boi passar;
  • Boi: é a principal personagem do grupo e que sai “atacando” todos a sua volta.

 

A música

Os bois tradicionais das comunidades do interior utilizavam músicas compostas por seus integrantes que falavam do cotidiano do agricultor. Os temas eram as dificuldades, a colheita os amores e as lendas locais. Os instrumentos normalmente eram o triângulo e a caixa. Com a intensa migração para a cidade, em especial nos anos 1960, pós Plano Nacional de Erradicação dos Cafeeiros Improdutivos, os bois passam a cantar o cotidiano dos trabalhadores urbanos, a homenagear personagens importantes das periferias da cidade ou satirizar políticos locais. Neste momento outros instrumentos de precursão são inseridos como surdo, tarol, caixa e chocalho. Além disso o ritmo da bateria e das músicas recebe forte influência primeiro das marchinhas e depois do samba.

Em sua atual configuração o Boi Tsunami apenas toca músicas em ritmo de samba, mas sem utilizar uma letra específica para suas apresentações.

 

A festa

Em sua atual configuração o Boi Tsunami apresenta-se nas ruas do bairro Boa Vista durante todos os dias de carnaval, sendo que a cada dia ele faz um percurso diferente pelo bairro. Entretanto, sem o aspecto devocional, o boi, apesar de ter surgido como ato de protesto, tornou-se apenas uma brincadeira, servido como divertimento dos trabalhadores que não tem condição de sair da cidade para passar o carnaval em outros lugares. Como os jovens do grupo são vinculados À comunidade católica do bairro, antes de qualquer apresentação, os integrantes reúnem-se para rezar o Pai Nosso.

Com o passar dos anos, os cortejos do boi pelo bairro estão ficando cada vez maiores e atraindo pessoas de bairros e até de cidades vizinhas.

 

A indumentária

Os integrantes dos bois tradicionais de Cachoeiro nunca tiveram uma indumentária própria, uma vez que os grupos eram abertos a qualquer pessoa que quisesse participar da brincadeira. Atualmente os integrantes da bateria do Boi Tsunami utilizam uma camiseta com o nome do grupo, mas a brincadeira continua a ser aberta a quem quiser participar.

Alguns dos personagens trajam roupas específicas como o espadeiro que se veste como um boiadeiro com chapéu, camisa xadrez, calça e capa. Este personagem porta também uma espada e é ele o responsável pelo domínio do boi, ou seja, é ele que controla a evolução do bicho durante o cortejo. Outro importante personagem é o dono do boi, que é quem comanda toda a evolução do grupo e também a bateria. Eles traja roupas de “fazendeiro”: chapéu, calça comprida e camisa xadrez.

Outro personagem importante é a mulinha, que é a que mais diverte a criançada. Trata-se de um homem, trajando camisa xadrez e chapéu que “veste” uma mulinha que sai à frente do grupo abrindo caminho para o boi passar no meio da multidão.

A personagem principal da brincadeira é o boi. Sua estrutura, ou seja, seu corpo, diferente dos bois de Muqui, primeiramente foi confeccionada com bambu, como tradicionalmente eram feitas as estruturas dos antigos bois da região, que é revestida de espuma e coberta com um tecido bem colorido. Com o passar dos anos, em função da durabilidade do material, o grupo passou a confeccionar a estrutura em ferro. Para a cabeça, é utilizado o crânio de um boi com chifres que é todo pintado e decorado com fitas coloridas.

 

O mestre

Sem o aspecto devocional, a figura do mestre, também chamado de dono do boi, foi substituída por uma diretoria escolhida entre os integrantes do grupo que é organizada como o coordenador do grupo (dono do boi), dois coordenadores de bateria e o integrante responsável por cuidar da estrutura do boi e também de carrega-lo durante as apresentações.

 

As informações sobre o Boi Pintadinho aqui transcritas foram passadas por Emerson da Silva Costa, coordenador do grupo, Flávio Ramos da Silva e Alexandro Gomes, coordenadores da bateria e José Luiz Cândido, carregador do boi.

 

Grupo de Boi Pintadinho:

Boi Tsunami do Boa Vista

Boizinho Tsunami

 

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