Bate Flechas de São Sebastião Menino Jesus e Nossa Senhora Aparecida – Zumbi
No ano de 1965, em função das dificuldades que estavam vivendo em Anutiba, distrito do município de Alegre, Maria José de Paula – que era mãe de santo e parteira – mudou-se para a cidade de Cachoeiro de Itapemirim em busca de uma vida melhor. Lá fixou-se no bairro Valão. Em 1968, Maria José fundou uma casa de oração no bairro Zumbi, mas apenas no ano de 1972 é que construiu sua casa de morada ao lado da Casa de Oração e mudou-se definitivamente para o Zumbi.
Foi no Zumbi que Maria José terminou de criar seus filhos. Quinze dias antes de falecer, um de seus guias chamou sua filha Niecina Ferreira de Paula Silva e entregou a ela sua missão. Isolina, como passou a ser conhecida na comunidade, assumiu os trabalhos como zeladora da casa no dia 25 de março de 1979, dia do falecimento de sua mãe.
Isolina nasceu em Itaici, mas aprendeu a bater flechas ainda criança, por volta dos 5 anos de idade, quando frequentava o Centro Espírita Nossa Senhora da Conceição e Mártir São Sebastião dos Martírios, na comunidade de Travessão, distrito de Anutiba. Segundo conta, essa casa era de descendentes de escravizados. Com apenas 17 anos de idade, começou a cumprir sua missão.
Ao assumir a casa de oração de sua mãe, pelos idos do ano de 1984, Niecina, sempre que chegava do trabalho no sábado à tarde, convidava as crianças da rua para ensinar as doutrinas espíritas do campo flecheiro, que é um campo de inspiração. Com o passar do tempo, essas crianças começaram a ir sozinhas para a casa de oração, para receber os ensinamentos.
Com a chegada dos “evangélicos” na comunidade e com o preconceito deles com a religião, muitos dos integrantes do Centro se converteram e se afastaram. Apenas 4 daquelas antigas crianças permaneceram na religião original. “Esses que se converteram só procuram o Centro quando estão com alguma dificuldade”, relata Dona Isolina.
Apesar de todas as perseguições religiosas e das dificuldades de manter seu Centro Espírita funcionando, o grupo de Bate Flechas de São Sebastião continua ativo, e no dia 12 de outubro, dia de Nossa Senhora Aparecida, a padroeira negra do Brasil, é realizada a maior festa do grupo, o Encontro de Bate Flechas, que teve sua primeira edição no ano de 1978.
O Encontro se iniciou com uma promessa de Isolina: ela pediu a Nossa Senhora um emprego e que a santa também a ensinasse a construir uma casa. Em troca, ela daria um bolo, acenderia uma vela, soltaria um foguete e também faria uma ladainha por 7 anos. Pedido atendido, em 1978 ela realizou a primeira ladainha, já com a presença de uma jornada visitante (as jornadas são as caminhadas dos grupos de flecheiros que visitam seus coirmãos nas festas dos padroeiros de seus terreiros).
Com o passar dos anos, a quantidade de jornadas foi aumentando e, em 2023, por exemplo, participaram da Festa em Homenagem a Nossa Senhora Aparecida 23 grupos de jornaleiros, totalizando cerca de 700 pessoas. Sabe-se disso porque, desde o ano de 1998, cada grupo que chega à festa assina o livro de presença.
A festa segue um ritual: ao chegar, o grupo de jornaleiros visitantes se posiciona em procissão e solta fogos para avisar ao grupo da casa que chegou. Ouvindo os fogos, o grupo da casa vai em procissão receber os visitantes e, quando se encontram, as bandeiras são trocadas. Após a troca das bandeiras, seguem em direção ao cruzeiro, circulando-o e batendo suas flechas ao som dos instrumentos de sopro de suas bandas. De lá seguem para a senzala, onde ficam os pretos velhos. Na senzala, fazem reverência a seus antepassados e seguem para o santuário. No santuário, circulam o cruzeiro interno e seguem para a mesa de oração, onde deixam sua palavra e abençoam a casa. No santuário, as bandeiras são destrocadas. Depois seguem para o almoço e esperam o horário da procissão, que acontece às 15 horas.
Na procissão, a imagem de Nossa Senhora Aparecida é retirada do altar e colocada em um andor, todo decorado com flores de papel crepom nas cores branca e azul, e segue por um percurso determinado no bairro, sempre ao som de foguetes. Em 2023, os fogos foram proibidos por lei municipal, o que, na opinião dos fiéis, tirou um pouco o brilho da festa.
Atualmente o grupo de Bate Flechas de São Sebastião possui 18 integrantes, entre músicos e flecheiros.
Texto produzido a partir de entrevista concedida por Niecina Ferreira de Paula Silva, Dona Isolina, a Genildo Coelho Hautequestt Filho, em novembro de 2023 e em janeiro de 2024.