Maria Laurinda Adão
Mestra de Caxambu
“O que a gente sabe é muito bom dividir com os outros”
Mestra do Caxambu de Monte Alegre, mulher de múltiplas faces, guardiã das tradições de seu povo. Assim é Maria Laurinda Adão, misto de rainha e guerreira, uma figura sempre exuberante com seus adornos coloridos, sorriso fácil e uma vitalidade que desafia o tempo. Aos 69 anos, mantém um ritmo de atividades intenso, dividindo-se entre as funções no grupo de Caxambu Santa Cruz e as lideranças espiritual e comunitária em Monte Alegre, lugar onde nasceu e sempre viveu.
Engajada, militante em frentes diversas – da cultura popular às causas trabalhistas e de gênero-, Maria Laurinda ganhou notoriedade em todo o Estado e até fora. É referência na Comunidade Quilombola de Monte Alegre. Nascida em 3 de julho de 1943, teve uma vida difícil e sofrida, mas nem por isso renunciou à alegria de viver.
Aos 12 anos assumiu o ofício de parteira. Foram mais de 100 crianças trazida são mundo desde então. “Nunca perdi alguma”, conta orgulhosa. Ao longo de 45 anos foi a parteira oficial das localidades de Monte Alegre, Pacotuba, Retiro, Boa Esperança, Jaboticabeira, Mangueira, Morcego, Santa Joana, Santa Maria, dentre outras.
Aos 25 começou a trabalhar como coveira, de forma voluntária, nos cemitérios de Monte Alegre e Morro Seco, ofício que ainda exerce, sempre que há necessidade.
Mãe solteira de uma única filha, aos 27 anos, jamais quis se casar. O pai Paulino Adão não aceitou e a expulsou de casa. Com o tempo fizeram as pazes. Não sobraram mágoas. Hoje tem quatro netos e quatro bisnetos.
Ainda criança já participava do Caxambu de Santa Cruz, que segundo relato dos mais antigos teria nascido no dia da libertação dos escravos, em 13 de maio de 1888, por iniciativa de um ancestral, um escravo que volta e meia era castigado no tronco por sua constante rebeldia.O grupo era comandado pelo avô José Ventura.
Mas somente aos 20 anos passou a ter uma participação mais efetiva, juntamente com a mãe Eremita e o irmão Paulo Adão, então mestre. Como ambos se tornaram evangélicos, Maria Laurinda assumiu a missão de mestra e líder do Centro Espírita São Jorge, com a ajuda da irmã Adevalmira.
Por sua atuação destacada nas diversas frentes em que milita, Maria Laurinda obteve reconhecimento e notoriedade. Em 2010 foi certificada como Patrimônio Vivo de Cachoeiro. Em 2009 foi uma das vencedoras do Prêmio Mestre Armojo do Folclore Capixaba e também ganhou o Prêmio Mestra Izabel, concedido pelo Ministério da Cultura.
Antes disso, em 2008, foi indicada entre as mulheres que ilustram o livro “Mulheres Negras do Brasil. Está também entre as três capixabas que ilustram o cartaz da Lei Maria da Penha. Em 2012 foi tema do documentário “Todas as faces de Maria”, financiado pela Secult.
Atualmente preside a Associação de Folclore de Cachoeiro, da qual é membro fundadora.“É um compromisso meu.Vim para ajudar outras pessoas, aqueles que precisarem. Se for determinado por Deus, estou junto”, detalha sobre a missão de mestre. Defende que o conhecimento deve ser compartilhado. Para ela o pior defeito do ser humano é a ingratidão.
Em 2008 o Grupo de Caxambu Santa Cruz recebeu do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) o título de Patrimônio Cultural do Brasil. No mesmo ano desenvolveu na escola de sua comunidade um projeto de resgate das raízes africanas. “É só alguém pedir que acendemos a fogueira e começamos a brincadeira”, diz com um sorriso aberto.
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