Ormyr Caitano

Mestra de Caxambu

“Na roda de Caxambu, quando danço esqueço de tudo”

Ormyr Caitano  tem fama de mulher corajosa, do tipo que enfrenta  até bicho perigoso como uma imensa  cobra surucucu, quando desafiada. O episódio ocorreu há muitos anos, mas ela é capaz de narrar com a emoção de quem acabou de vivenciar a aventura. Graças ao gesto destemido,  conquistou a fama heroica.

Aos 69 anos, a mestra jongueira confessa que gosta mesmo é de dançar numa roda de Caxambu. “Quando danço, esqueço de tudo”.  A exemplo da irmã Canuta, Ormyr fundamenta o sentido de sua existência no microuniverso da comunidade de São Sebastião de Vargem Alegre,  fundada pelo avô, “o velho Caetano”, nas memórias da família e na tradição do folguedo surgido nos tempos do “cativeiro”.

“Foi meu avô que mandou fazer o oratório e construiu a primeira capelinha na região”, conta orgulhosa, ao mesmo tempo em que evoca lembranças da mãe Antônia, boa cozinheira, parteira, costureira e rezadeira. E conta também travessuras dos tempos de menina, rememora “pinimbas” inocentes com as irmãs, as brincadeiras no casarão da família e a discriminação sofrida na escola. “Era muito difícil para uma criança negra aprender naquela época”, relata.

A união é um traço determinante na família Caetano. A forte ligação entre os irmãos e irmãs se fundamenta na atualização permanente da memória do clã. É por meio da repetição das  histórias vivenciadas ou relatadas pelos pais e avós  que essa união se fortalece.

Ormyr saiu da casa dos pais ainda menina para trabalhar como babá numa fazenda próxima. Já adulta seguiu para o Rio de Janeiro. Casou-se, teve dois filhos, mas acabou deixando o marido e retornando para Vargem Alegre, lugar que considera seu destino. Trabalhando como lavadeira, criou os filhos sozinha, com o apoio da família. Atualmente mora em Cachoeiro, mas está sempre em Vargem Alegre.

Reconhecida como Patrimônio Vivo de Cachoeiro em 2012, a mestra jongueira diz que o Caxambu ajuda a manter viva a lembrança dos antepassados. “O Caxambu é uma dança que se dança sem cavalheiro. Qualquer um pode dançar”, assegura.

A iniciação no folguedo ocorreu na infância. “Criança não podia entrar na roda. Mas aí a gente fazia uma roda nossa e brincava com latas de querosene”, rememora com ar travesso. Perto de completar 70 anos, garante que numa roda não sente o peso da idade. Quem já a viu dançar, concorda de  pronto.  “É o Caxambu que dá sentido ao que somos”.


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